Em nossa jornada afetiva, muitas vezes nos encontramos em encruzilhadas silenciosas. Optar por não opinar, por se resguardar, pode parecer uma estratégia inteligente para evitar conflitos. Um cliente pode descobrir que, ao se calar diante dos dilemas do parceiro ou da família, sente um alívio, uma leveza por não carregar fardos alheios. Esse movimento pode ser positivo, indicando um foco maior em si mesmo e menos projeção das próprias questões nos outros. No entanto, esse silêncio tem um eco, alterando a dinâmica conhecida e, frequentemente, provocando reações inesperadas no outro.
A dança das expectativas e reações
Quando mudamos nossa forma de interagir, o parceiro, habituado a um certo padrão (talvez a receber lembretes, opiniões ou até críticas), percebe a diferença. Ele pode se tornar mais reativo, mais “provocador”, como se testasse as águas para entender o que mudou. É um ajuste natural de um sistema que busca o equilíbrio perdido. Freud falaria aqui das complexas transferências e contratransferências que operam sob a superfície das interações.

É preciso ter paciência: assim como nós precisamos de tempo para consolidar nossa nova postura, o outro também precisa de tempo para se adaptar. Não se trata de um “adestramento” consciente, mas de uma rede de expectativas implícitas que se reconfigura.
Camuflando a dor real
Muitas vezes, as dificuldades que trazemos à tona em um relacionamento (queixas sobre dinheiro, rotina, pequenas manias) funcionam como uma cortina de fumaça. Podem estar encobrindo dores mais profundas, como a insegurança gerada por uma infidelidade passada, o medo do abandono, ou a sensação crônica de não ser verdadeiramente visto ou valorizado.
Focar em um problema secundário é um mecanismo de defesa clássico para evitar o confronto com a ferida primária. A dificuldade em aceitar a explicação do parceiro para um ato que nos magoou geralmente ocorre porque a justificativa apresentada não toca na raiz emocional da questão, nem na nossa nem na dele.
Repetição e a busca por reconhecimento
A busca por um novo amor após uma decepção é, frequentemente, uma busca por aquilo que faltou: atenção, escuta, desejo, reconhecimento. Contudo, caímos facilmente na armadilha da repetição. Atraímos parceiros ou situações que reeditam velhas feridas, muitas vezes ligadas às nossas primeiras relações familiares.

Não é “dedo podre”, mas uma identificação inconsciente com padrões conhecidos, na tentativa talvez de dominá-los ou resolvê-los. Uma cliente, por exemplo, pode se sentir estranhamente “em casa” com um parceiro que a despreza, se cresceu em um ambiente familiar onde o desprezo era a forma de “afeto” conhecida. Reconhecer esses padrões, ligados à nossa autoimagem mais profunda, é crucial para buscar relações mais nutritivas.
Conclusão: a coragem da conversa franca
Nenhum relacionamento sobrevive e floresce na ausência de diálogo honesto. A entrega total é um mito; sempre haverá um pequeno espaço íntimo que é só nosso.
No entanto, a saúde da relação depende da disposição de compartilhar o máximo possível, especialmente as verdades difíceis. Evitar a conversa necessária, por medo da reação do outro ou do confronto com a própria dor, cria um abismo de suposições e ressentimentos. É como navegar em um barco onde cada um rema para um lado, em silêncio.
A única bússola confiável é a comunicação aberta e franca, onde há espaço para ouvir e ser ouvido, mesmo nas discordâncias. Como Carl Jung enfatizaria, a individuação e a saúde psíquica passam pela integração das nossas sombras e pela coragem de sermos autênticos em nossas relações. Independentemente do futuro da relação, a capacidade de conversar abertamente é a chave para um desfecho mais consciente e menos doloroso.